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QUEM PODERIA IMAGINAR QUE NAQUELE CASARÃO…
Adamastor Orlando e sua esposa Ofélia Alberica adoraram o café da manhã daquele hotel em Puerto Varas, no sul do Chile… ele adorara que servissem todas as manhãs, uma jarra de suco de toranja (*), ela adorava uma fruta local chamada “papaya”, mas que na verdade parecia um mistura de mamão com maracujá… chegaram àquela cidade, no final do dia anterior… O tempo estava nublado, resolveram então que o melhor era não fazer nenhum passeio motorizado pelos arredores… poderiam comer algo, beber vinho e caminhar pelas redondezas…
Ofélia Alberica sugeriu comer no restaurante do hotel, afinal no dia anterior almoçaram em um restaurante bastante exótico em Ancud, na ilha de Chiloé… comeram Curanto, um prato típico local em que mariscos, e pedaços de carne de frango e de porco são cozidos com folhas de uma planta chamada “pangue”, até que gostou, mas achou o sabor um tanto quanto forte…
Adamastor Orlando tinha preconceito com comida de hotel e preferia sair para procurar um lugar intuitivamente, como acontecera no dia anterior, quando sem querer se deparou com o retro-mencionado restaurante, onde entre a exótica decoração, conseguiu fotografar uma bem-humorada placa: “Aqui se come mal, pero al frente se come peor.”… fotografou também o tal do prato típico e depois comeu quase tudo (com exceção aos pedaços de frango que considerou suspeitos).
Mas naquele dia, resolveram comer no hotel … após a refeição, o nosso protagonista se surpeendeu pois além da “comida-de-hotel” estar excelente, naquela viagem haviam passado pela Argentina, mas foi justamente no Chile que comeram a melhor carne… “_- É preciso desmistificar as coisas –argumentava para sua cara-metade – vejam o caso do Bar Léo…
Depois do farto almoço, foram caminhar pela cidade … primeiramente visitaram a catedral, depois seguindo pela Calle Verbo Divino, sem querer se depararam com um antigo bairro alemão nos arredores da Calle San Ignacio … antigas casas de madeira, muitas mal-conservadas, mas sempre com um jardim arrumado, com cortinas, e muitas vezes com algumas belas flores… no início os nossos protagonistas ficaram deslumbrados com o ambiente, porém ao caminharem em direção a Calle Del Salvador, Calle Otto Bader, Calle Chrstel Fresse e arredores, reparavam que as pessoas entravam apressadamente paras as casas assim que os avistavam, Ofélia Alberica dizia para Adamastor Orlando que não estava gostando do ambiente, que estava assustada pois aquelas casas pareciam estar mal-assombradas, com olhinhos sorrateiros a prescurtar os passos dos transeuntes … O nosso protagonista também achava a mesma coisa e queria retornar ao centro da cidade, quando um jovem os interrompeu perguntando se eram brasileiros… ele falava português quase sem sotaque, disse que se chamava Fantito Gasparez e que havia morado no Brasil alguns anos e também que gostava de conversar na nossa lingua… disse ainda que morava na casa da esquina em frente… e convidou-os para um chá…
O casal, a princípio titubeou, porém sem jeito, resolveu aceitar o convite: era uma casa antiga, por fora parecia estar mal-assombrada, mas por dentro era magnífica: móveis da década de setenta bem conservados (a maioria de fórmica), um toca-discos antigo, luminárias de acrílico, caixotes com discos de vinil, cartazes dos filmes “Terra Em Transe” de Glauber Rocha e “O Bandido da Luz Vermelha” de Rogério Sganzerla…
Adamastor Orlando estranhou alguém possuir estes cartazes sobre antigos filmes brasileiros em um local tão distante de Pindorama, e enquanto o anfitrião preparava o chá o nosso protagonista pediu permissão para olhar os livros e os discos de vinil… permissão concedida, Adamastor reparou na existência de um exemplar original de “Panamérica” de José Agripino de Paula, outro de “Deus da Chuva e da Morte” de Jorge Mautner…. reparou também em alguns Long Plays da época da tropicália: discos de Caetano, Gil, Gal e Mutantes…
O chá é servido …. Fantito Gasparez contou a sua estória… disse que passou bons anos no Brasil e que retornou ao Chile no início de setenta e três… depois a narrativa ficou um pouco confusa…
O casal protagonista disse que precisava ir embora, pois temia estar sendo inconveniente… despediram-se… o anfitrião sorridente os acompanhou até a porta…
Quando estavam a cerca de cinquenta metros de distância, Adamastor Orlando disse que tinha algo errado naquela casa e resolveu voltar, Ofélia Alberica disse que era tudo imaginação dele, que seria melhor não perder tempo e seguir logo para o hotel…. ele porém retornou à casa de Fanturito Gasparez e sorrateiramente espiou pela fresta da janela…
Adamastor não acreditou no que viu: a casa estava vazia e parecia estar a muito tempo abandonada.
Tagged mini-contos, tuda“Ir a um coquetel em San Juan significava encontrar tudo o que há de mesquinho e ganancioso na natureza humana. Sua pretensa sociedade não passa de uma horda estonteante e barulhenta de ladrões e vigaristas pretensiosos, um show de horrores entediante repletos de fraudes, palhaços e filisteus com mentalidades mancas.”
(Hunter S. Thompson – Rum: Diário de Um Jornalista Bêbado) – L&PM Pocket –
Neste final de semana li o livro Rum: Diário de Um Jornalista Bêbado – Hunter S. Thompson Rum: Diário de Um Jornalista Bêbado (L&PM Pocket -253 páginas)… fui assistir o filme também: Diário de Um Jornalista Bêbado (The Rum Diary) dirigido por Bruce Robson… a adaptação cinematográfica é um desastre: funde dois personagens em um (*), acrescenta várias coisas que não tem no livro (algumas de humor para adolescentes-mentais) e altera o final… achei que o grande ator Johnny Deep, por ter sido amigo pessoal de Hunter Thompson iria interpretar magistralmente e personagem Paul Kemp (um alter-ego do escritor), mas ledo engano, o único personagem que se salva é o fotógrafo Bob Sala interpretado por Michael Rispoli…
Esqueçam o filme e fiquem com o livro: é mais poético, mais divertido e menos estereotipado… e custam o mesmo valor: o ingresso do cinema custou os mesmos dezenove reais da edição de bolso…
(*) No livro o namorado da personagem Chernault é Yeamon, um jornalista maluco, sem dinheiro e valentão, enquanto que o ex-jornalista e jovem empresário Sanderson apresenta tendências homossexuais, no filme estes dois personagens são fundidos em uma única pessoa, o que altera toda a estória… no livro também não existem brigas de galos, apostas, cenas de carro em alta velocidade, etc.
Tagged cinema, literaturaFiz o esboço desta aquarela em Vila Traful, no sul da Argentina… as cores foram colocadas hoje!!!
Tagged aquarelasEstou lendo “Padre Antônio Vieira – Essencial” uma coletânea de textos deste escritor organizada por Afredo Bossi – Penguin Companhia – 752 páginas…É muito interessante como muitos textos de Vieira são atuais, veja por exemplo este pequeno trecho do “Sermão da Sexagésima” proferido em 1655… nele o padre se refere aos sermões proferidos pelos outros padres, que em vez de focar um só assunto ficam a discorrer sobre uma infinidade de coisas e perdem o fio da meada… hoje, mais de três séculos após, as mais diversas mídias agem como os maus pregadores do passado: lançam uma multiplicidade de informações sem se aprofundar em nada a confundir as mentes desta pobre geração boçalizada por esta nova “cultura” superficial e fragmentária… leiam abaixo as palavras proféticas deste gênio da literatura:
“O sermão há-de ter um só assunto e uma só matéria. Por isso Cristo disse que o lavrador do Evangelho não semeara muitos géneros de sementes, senão uma só: Exiit, qui seminat, seminare semen. Semeou uma semente só, e não muitas, porque o sermão há-de ter uma só matéria, e não muitas matérias. Se o lavrador semeara primeiro trigo, e sobre o trigo semeara centeio, e sobre o centeio semeara milho grosso e miúdo, e sobre o milho semeara cevada, que havia de nascer? – Uma mata brava, uma confusão verde. Eis aqui o que acontece aos sermões deste género. Como semeiam tanta variedade, não podem colher coisa certa. Quem semeia misturas, mal pode colher trigo. Se uma nau fizesse um bordo para o norte, outro para o sul, outro para leste, outro para oeste, como poderia fazer viagem? Por isso nos púlpitos se trabalha tanto e se navega tão pouco.”
(Padre Antônio Vieira)
Tagged literatura