“Não é realmente difícil de compreender baseados em que princípios de interesse nossos antepassados agiam? Eram tão cebos que não percebiam que a destruição de míriades de indivíduos é apenas uma positiva vantagem para a massa!(…)
Todos os homens ‘votavam’, como diziam eles, o que quer dizer que se intrometiam nos negócios públicos, até que afinal se descobriu que o que é negócio de toda a gente não é negócio de ninguém e que a “República” (era assim que se chamava a coisa) estava sem governo nenhum” (…) Enquanto os filósofos, contudo, se ocupavam em corar de sua estupidez por não terem previsto estes males inevitáveis e se esforçavam por inventar novas teorias, a questão foi levada a uma solução brusca por um sujeito chamado Plebe, que tomou em suas mãos e estabeleceu um regime despódico em comparação com o qual os dos fabulosos Zeros e Helofagabaluses eram respeitáveis e deleitosos. (…)”
( Edgar Allan Poe )
Acabei de ler todas as obras de ficção publicadas pelo famoso escritor norte-americano, e agora me dedico à leitura de seus ensaios. Fiquei impressionado por um conto denominado “Mellonta Tauta” (que significa “Coisas do Futuro” em grego) publicado em 1849 no Godey’s Lady’s Book. Este texto descreve uma carta (enviada do futuro, mais precisamente em primeiro de abril de 2848) encontrada em uma garrafa… Neste conto, cujos fragmentos estão expostos acima, Poe prevê, entre outras coisas, a preponderância das massas sobre o indivíduo, a falácia da democracia com a mistura entre o Público e o Privado, a ascenção de governos totálitários-popularescos…
Realmente ele era profético…
Curioso é que lendo “A Filosofia da Composição” em que ele relata o método empregado para conceber seu mais famoso poema, descubro que Poe começou a escrever “O Corvo” pela antepenúltima estrofe, e que a primeira palavra empregada no poema foi PROFETA, vejam o que ele dizia:
“Aí, então, pode-se dizer que o poema teve seu começo pelo fim por que devem começar todas as obras de arte, porque foi nesse ponto de minhas considerações prévias que, pela primeira vez, tomei do papel e da pena para compor a estância:
Prophet!” said I, “thing of evil–prophet still, if bird or devil!
By that heaven that bends above us–by that God we both adore
Tell this soul with sorrow laden, if, within the distant Aidenn,
It shall clasp a sainted maiden, whom the angels name Lenore
Clasp a rare and radiant maiden, whom the angels name Lenore?
Quoth the raven, “Nevermore.”
Profeta!” exclamo. “Ó ser do mal! Profeta sempre, ave infernal!
Pelo alto céu, por esse Deus que adoram todos os mortais,
fala se esta alma sob o guante atroz da dor, no Éden distante,
verá a deusa fulgurante a quem nos céus chamam Lenora,
essa, mais bela do que a aurora, a quem nos céus chamam Lenora!”
E o Corvo disse: “Nunca mais!”
Não seria esta profética ave negra, uma metáfora do própio POEta que pousado no busto branco de Minerva estava dizendo que após sua chegada a literatura ocidental NUNCA MAIS seria a mesma???
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