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Picasso-Le_Dejeuner_sur_LHerbe

A VELHA FAZENDA

Após tanto tempo Josias Germano retornava à antiga fazenda Santa Judith, que pertencera a seu avô, no município de Tabijú (situado no meio do caminho entre Araraquara e Jaú), no interior paulista… aliás sobre o nome da cidade, uma curiosidade: pesquisando na internétis, o nosso protagonista descobriu que uma provável origem do nome Trabiju foi a expressão “trés bijoux” utilizada por engenheiros ferroviários franceses ao avistar o local em questão… Josias sabia que aquilo era coisa de seu avô, o velho Josias, que gostava de inventar e(hi)stórias, uma vez que as ferrovias paulistas foram construídas por engenheiros ingleses e não franceses, além do mais Trabijú não tinha nada de especial para despertar tais exclamações…

Depois de passar pela entrada, a mesma desde a década de setenta (sob um rústico pórtico a inscrição “Fazenda Santa Judith” em uma placa azul com as letras brancas), o nosso protagonista percebeu que nada mudara: a longa descida entre os algodoais até o curral, depois virar á direita, e seguir até a sede…

A construção estava idêntica, tal qual as lembranças de sua infância: as duas redes, colocadas nas extremidades da ampla varanda, que rodeada por jardineiras baixas, cheias de espinheiras, pintadas em cinza com tarjas brancas… o mesmo chão de lajotas, os mesmos pôsteres feitos de cartazes de exposições de Picasso, as mesmas poltronas de couro, os mesmos lustres da sala construídos com rodas de carroça… o mesmo piano-bar, no qual um piano de cauda repousava sobre um piso de azulejos hidráulicos pretos e brancos, tal qual um tabuleiro de xadrez, ao lado de um balcão de bar de madeira escura cujo fundo apresentava uma vasta variedades de bebidas extremamente requintadas…

O despertador tocou, o nosso protagonista e sua esposa Marília Olávia estavam passando férias na Anadaluzia, mais precisamente em Alcalá de Los Gazules, e mais uma vez ele sonhara que estava de volta a fazenda do seu avô… era um sonho recorrente… ele ficou alguns momentos recordando o que sonhara e achou engraçado que no sonho aparecesse o piano-bar… no resto a fazenda sonhada era bem semelhante a de suas lembranças, com exceção aquele piano-bar que jamais existira…

Após um desayuno composto por embutidos gazules (com destaque especial para o jamón belota), gazpacho andaluz e suco de pomelo, o casal protagonista foi dar um passeio pelo vilarejo de casas brancas, pelas ruínas do castelo e das muralhas muçulmanas e depois pelas cercanias repletas de oliveiras e mais oliveiras… durante o passeio Josias Germano perguntava a si-mesmo qual era o motivo daquele sonho? Por que sempre a fazenda de seu avô?

Ao retornar ao vilarejo, uma pausa em um boteco local para umas taças de jerez… ao saborear aquele vinho com gosto de concha marinha, Josias reparou que na parede do bar havia uma reprodução de “Le déjeuner sur l’herbe” uma releitura que Pablo Picasso fizera da obra homônima de Edouard Manet… lembrou-se então que na fazenda “Santa Judith” havia um poster idêntico (seu avô fora um pioneiro em emoldurar pôsters, que costumava trazer de suas andanças européias)

Foi então que o nosso amigo percebeu que a fazenda é um símbolo da infância feliz, do aconchego familiar em meio a um ambiente rústico porém culturalmente requintado; e que em todo lugar com tais características, como era o caso de Alcalá de Los Gazules, estaria sempre na fazenda de seu avô…

− Um brinde a Trabiju!!! falou em voz alta.

Marília Olávia arregalou os seus olhos mouros espantada olhando assustada para sua cara metade e antes que ela dissesse algo Josias emendou:

– Calma que, no hotel eu explico…

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