DE UM LIVRO A OUTRO , A TRAVESSIA DA CATALUNHA MEXICANIZADA À BANDA ORIENTAL DO URUGUAY
“Não era difícil reconhecer de longe a barraca das duas mulheres, o lixo, melhor dizendo, uma série inclassificável de objetos usados e inúteis, não propriamente jogados fora, se amontoava formando cones de trinta centímetros de altura ao longo do perímetro da barraca, como ameias de uma fortaleza miserável.”
( Roberto Bolaño – tradução : Eduardo Brandão )
Depois de “Putas Assassinas”, terminei de ler outro livro de Roberto Bolaño, “Pista no Gelo”… enquanto o primeiro é uma série de contos ( geniais, por sinal ), “Pista no Gelo” foi o romance de estréia deste excepcional romancista chileno ( que viveu no México e na Espanha ), que apresenta a mesma agilidade e estrutura fragmentária que depois apareceria em “Detetives Selvagens” …
Agora estou lendo “O Cavalo Perdido e Outras Histórias” livro de contos do uruguayo Felisberto Hernández, leiam um pouquinho:
“Dentro de um quadro havia duas ovais com as fotografias de um casal de parentes de Celina. A mulher tinha a cabeça inclinada bondosamente, mas a garganta, aumentada, me fazia pensar num sapo. Uma das vezes em que olhava para ela, fui atraído, não sei como, pelo olhar do marido. Por mais que o observasse com rabo de olho ele me olhava de frente e no meio dos olhos. Até quando eu caminhava de um lugar para outro da sala e tropeçava numa cadeira, seus olhos se dirigiam ao centro de minhas pupilas. E era fatalmente eu quem tinha que baixar o olhar. A esposa expressava doçura não só com a inclinação, mas com todas as parte da cabeça: até com o penteado alto e a garganta de sapo. Deixava que todas as suas partes fossem boas: era como uma grande sobremesa, gostosa por qualquer lado que se provasse. Mas havia algo que ela não somente deixava que fosse bom, mas que estava dirigido a mim: isso estava nos olhos. Quando eu tinha a preocupação de não poder olhar para ela à vontade porque ao lado estava o marido, os olhos dela tinham uma expressão e uma maneira de entrar nos meus que equivalia a me aconselhar: “não ligue para ele, eu te entendo, meu querido”.
( Felisberto Hernández – tradução : Davi Arrigucci Jr. )
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